domingo, 22 de agosto de 2010

Continuação em http://icdif.com/blog

O blog foi movido para http://icdif.com/blog onde será continuado.

sábado, 26 de junho de 2010

O Baile

Aquele que tudo seca e aquela que sempre vem formam um par inesperado neste baile cósmico-existencialista onde os convites são infinitos e a presença obrigatória.
Eu observo, vagueando com os olhos para combater o tédio, ansiando a minha vez.

Os acordes dodecafónicos ecoam nas paredes vazias que envolvem esta sala criando uma sensação de omnipresença sonora. Pelo contrário, a cor não é constante, tem mudanças suaves e periódicas.

Estarei a dançar? Sim! Estamos todos a dançar em movimentos predominantemente compassados, mas por vezes bruscos e aleatórios.

Eu não sei, nem se quer consigo imaginar, se há alguma forma “correcta” de dançar esta sequência de sons, limito-me a seguir de forma quase passiva e robótica o movimento dos reis.

O casamento dá-se assim aos olhos de todos: à medida que a música se desenvolve num crescendo final, ela evolve-o com os seus mantos negros, provocando uma quebra brusca e definitiva no eco sonoro e, consequentemente, no compassado movimento da multidão.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Rochas e vento

Contemplando o infinito e escutando o submundo, assim existo eu. Tudo o que sei inspiro neste vento gélido que ecoa nas árvores profundamente enraizadas nas rochas milenares.
Contemplação e inspiração, duas acções aparentemente distintas, contudo complementares e de suma importância nesta colina.
Nem mesmo aqui, onde o vento sopra incessantemente, as dúvidas se esbatem. Eu atraio-as, tal como as oposições, não sendo capaz de me satisfazer com a ordem nem com as certezas. O caos é o alimento desta mente vagueante e incerta que perscruta as saliências da superfície da realidade.

E a casa? Aqui está ela, como que por magia abandonada no meio das árvores e das rochas. Reconstruindo os seus laços com a Natureza, afasta-se de mim. O que me resta? O sol? Não... Esse esconde-se, primeiro aproveitando as nuvens passageiras e depois o horizonte permanente.
Fico só, muito só. Apenas as contradições, só a elas pertenço e me entrego. Até o vento me levar...

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O Rio

Com os pés descalços afago o rio que corre junto a mim. Que estranha relação de proximidade esta; sinto-me, de alguma forma, atraído pelo curso de água, mas não consigo ser aceite por este. Estou constantemente a ser rejeitado quando tento mergulhar...
Tentei assumir a postura física dos seres que vejo viverem como que numa relação de simbiose com a água, no entanto o resultado não melhorou: apenas consegui engasgar-me enquanto era empurrado para a superfície.
Enquanto as dúvidas me assolam como chagas, pequenas ondas aparecem e desaparecem de forma súbita na superfície rugosa deste rio que me faz cócegas provocadoras nos pés. Será que me chama?
Não atendo a chamada, volto as costas, estendo-me no chão de olhos fechados, deixo-o seguir a sua aparentemente eterna viagem e tento dormir. Será mesmo eterna? Para onde se deslocará? Perguntas que me roem por dentro impedindo o sono de aparecer.
Vasculho a mente, por entre factos e imaginação, procurando respostas às minhas questões... Apesar da certeza que tenho na capacidade para atingir a clarificação das dúvidas, elas teimam em não se esclarecer; fogem pelos meandros das ideias por criar do meu cérebro...
Volto a mim como que assustado por um sonho marcante. Abro os olhos aos poucos, voltando-me a ambientar à realidade. Como estará o rio? Mesmo já tendo pensado tantas vezes da mesma forma, insisto na ideia: tem de ser hoje que consigo penetrar nos segredos da água que corre...
Corro, como nunca corri na vida, em direcção ao rio e salto com impulsão forte, de forma a cair o mais longe possível da margem. A meio do salto sinto a falta de algo e reparo que já não há rio! Apenas um lodo viscoso recheado de pedras pontiagudos que fazem a minha aterragem não se me afigurar muito agradável. No momento antes de atingir o chão, penso: o rio viajou e secou; e eu, que estou prestes a secar, o que fiz?

domingo, 24 de janeiro de 2010

Tempo

Olho para o passado e penso no futuro. Nada alcanço; o vazio fere os olhos de forma fria e constrangedora.

Ponho os óculos e volto a fixar o tempo serpenteante. Nem protecção nem filtro, continua o vazio seco e amargo que deixa uma nódoa no cerne do meu órgão raciocinante.

Ele corre de forma aparentemente imutável qual riacho na direcção do imensamente longínquo por vir. Eu observo incapaz de enxergar, sentindo-me posto de parte mas não imune à sua acção...

As raízes nascem prendendo-me à realidade que me impede de fugir.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Desumanidade

Durante as minhas profundas ponderações acabo por me deparar com dilemas sobre que significa ser humano. Ao longo da história muita tinta se derramou sobre esta matéria, tendo por base diferentes maneiras base de ver o mundo, por exemplo a cosmogenia/teogonia dos gregos, a trindade cristã e hoje em dia, geralmente, sob o olhar da ciência.
Conhecendo estas vertentes e tantas outras provenientes de boatos, de mitos urbanos ou de tantas mais fontes, apercebo-me que nenhuma delas me seduz nem responde àquilo que eu anseio saber.
Normalmente todos associam o significado de ser humano a humanismo, apesar de não concordar totalmente com a definição, vou basear o meu próximo raciocínio neste ponto.
Existe um significado que, de tanto ser falado, se tornou quase inato de humanismo: amor pelo próximo conjugado pelo gosto de ver a sociedade organizada segundo este princípio. Pelo contrário, e por muito confuso que isto pareça a mim mesmo, por vezes sinto gozo em ver uma sociedade cruel e conflituosa. Chego até ao ponto de sentir necessidade de contribuir para essa desorganização, sinto vontade de plantar a semente (ou de induzir) o caos e de o ver tomar o seu curso natural (A minha glória é essa, criar desumanidade, in Cântico Negro de José Régio). Isto talvez se deva (tenho de perder o vício de tentar encontrar explicação para tudo) a eu sempre ter vivido de forma alheia à organização social dos seres humanos e de presenciar os factos como um narrador que apenas relata a história e não participa nela.
Ao contrário da falta de viver sentida pelo mesmo José Régio: “Que eu vivo com o mesmo sem-vontade com que rasguei o ventre a minha mãe”, eu nem sinto que vivo, mas sim que presencio sem viver, daí por vezes me considerar desumano (apesar da incongruência de me auto-catalogar com atributos humanos).
Vivo no caos provocado por mim, dele me alimento e vejo a vida lá fora a passar como um filme antigo projectado a preto e branco (sendo que eu tenho uma tesoura para golpear estrategicamente a fita)...

quinta-feira, 12 de junho de 2008

O vento

Sopra... Sopra e leva os meus pensamentos. Faz com que eles voem para longe... Para muito longe...
O tempo passa e o o vento continua a soprar mas os pensamentos não deixam de me atormentar.
Alguém diz que preciso esvaziar a mente para me poder concentrar no simples acto de apreciar a natureza. No entanto eu não sou assim, não consigo dissociar o acto de contemplar do acto de compreender, por isso a minha mente está sempre a ser agitada por pensamentos invasores.
Não sei se este é o caminho acertado, mas este trilho foi por mim escolhido e por conseguinte é meu, advém das minhas ideias e actos, e como eu costumo dizer: “mais vale escolher e errar do que ser passivo e não procurar respostas”.
O vento abranda e eu sinto os pensamentos a diminuir de intensidade dando lugar à tristeza. Um tipo de sentimento que me é tanto familiar, mas não penso que, sentido desta forma, seja muito comum no ser humano, pois assim só se sentem aqueles que buscam e não encontram: “(...) A inteligência gera tristeza (...)” in O Rei de Inverno de Bernard Cornwell.
Junto com a tristeza e a soturnidade, sou invadido pela sensação de que as minhas buscas me levam a um estado de isolamento que me transporta para mais próximo da compreensão do meu verdadeiro eu e quem sabe da resposta às minhas questões, pois suspeito que estas se encontram escondidas dentro de mim...